Investidor vs. Trader

O motivo original para alguém comprar ações é tornar-se sócio de uma empresa, participando do sucesso dela, que se traduz em lucro. Esse lucro será distribuído entre os sócios – são os dividendos. O lucro também pode ser reinvestido na empresa, gerando valorização, pois isso deve aumentar os dividendos no futuro. Assim, a valorização pode ser vista como a não retirada dos dividendos, que são deixados lá como novo investimento.

Na prática há uma distribuição entre ambos – parte do ganho será em valorização, parte em dividendos. A maioria das empresas paga menos dividendos e busca mais valorização – principalmente em uma economia que cresce e a empresa acredita que há espaço para crescer.

Algumas empresas, de alguns setores específicos, possuem pouco espaço para reinvestir. Nesse caso boa parte do lucro é paga como dividendos. Essas empresas são boas para o iniciante, pois tipicamente seu preço oscila menos.

O Investidor

O investidor é, então, aquele que compra ações da empresa porque quer realmente ser sócio dela. Ele acredita que a empresa é capaz de gerar riqueza, portanto quer entrar na sociedade. Irá ganhar com os dividendos pagos, ou com a valorização da empresa.

O investidor compra as ações para o longo prazo. Muitos perguntam quanto tempo significa longo prazo. Creio que a melhor resposta para isso seja um prazo indeterminado, ou seja, o investidor realmente acredita que o dinheiro investido em ações é uma boa forma de rentabilizá-lo, portanto não pretende se desfazer delas tão cedo – ele não precisa ter um horizonte para isso. Talvez longo prazo seja isso: um prazo que pode continuar indefinidamente no tempo.

Isso não significa que ele não possa vender as ações. Ele pode se achar que há outro investimento à vista. Ele não pode, isso sim, ser obrigado a retirar o dinheiro por necessidade.

Não coloque na Bolsa dinheiro que você possa precisar em algum momento à frente. Você poderia ser obrigado a retirá-lo em um momento ruim, de baixa. Você deve estar no comando, não as circunstâncias.

Alguns termos usados para designar o investidor são:

  • compra para “sentar em cima das ações”;
  • compra e “esquece”;
  • compra para “encarteirar”;
  • ele é “Buy and Hold”.

Esses termos não devem dar a idéia de não olhar mais o que acontece, mas que não precisa olhar o tempo todo. Talvez no início você se comporte como os meninos que plantam feijão no algodão pela primeira vez. Com o tempo você será como um experiente agricultor, que enterra as sementes – parte de seu capital – e aguarda pacientemente.

Não importa que nas primeiras semanas nada esteja acontecendo, ele sabe que as plantas irão germinar.

O Trader

O Trader, por outro lado, quer tentar tirar proveito das oscilações dos mercados nervosos. Não pretende ser sócio das empresas, apenas deseja utilizar as ações como veículo para tentar ganhar algum dinheiro. Ele as compra especulando que o preço irá subir, ou as vende esperando que o preço caia, para recomprar mais barato.

Creio que seja saudádel perguntar de onde vem o dinheiro ganho em ações. No longo prazo, o dinheiro vem da riqueza gerada pela operação da empresa, se ela estiver bem organizada e competitiva. No curto prazo as operações de Bolsa são a soma zero. Se alguém ganhou 3% em 4 dias, esse dinheiro deve ter vindo de outras pessoas. Ou seja, no curto prazo o que um ganha outros devem perder, ou deixar de ganhar. Em 4 dias não houve tempo da empresa ter gerado esses 3%. Não existe empresa que gere este tipo de rentabilidade de forma sustentada.

Imagine uma família com as contas unificadas que joga pôquer em uma noite de veraneio. Esse é um jogo a soma zero. O que um membro ganhar, outro vai perder. Se somar todos os ganhos e subtrair todas as perdas, o resultado será zero. A família continua na mesma, só perdeu tempo.

Traders acreditam que podem identificar oscilações de curto prazo, ou preços mal avaliados, e utilizá-los a seu favor. Eles sabem, entretanto, que podem perder dinheiro em algumas operações.

Traders ganham dinheiro que outros deixaram. Investidores ganham dinheiro que a empresa gera, com seu bom funcionamento.

Traders são especuladores. No mercado de capitais esse termo não têm o viés negativo que possui fora dele. De fato, eles trazem alguns benefícios como aumentar a liquidez do mercado – sempre que você for precisar vender uma ação, haverá alguem disposto a comprá-la. É por isso que o mercado de ações é tão liquido.

Se só houvesse investidores, provavelmente o preço das ações não oscilaria tanto.

Entretanto você teria de esperar dias ou semanas para vender suas ações. Nesse caso você também não teria cotações o tempo todo.

Se você possui um apartamento, por exemplo, você não tem cotações dele mudando a cada minuto – note que a cotação é o preço do último negócio realizado. No caso dos imóveis você faz uma avaliação – que é uma estimativa – ou espera meses ou anos até que algum vizinho venda um apartamento parecido no prédio para te dar uma noção do preço.

Pessoas conseguem esperar anos para vender seus imóveis. Ver o preço de suas ações piscando na tela, entretanto, exerce uma pressão maior e faz com que muitas pessoas entrem no jogo. E nesse momento você começa a se tornar um especulador, e de um tipo perigoso, o desavisado.

Como já disse, há uma áura negativa em torno da Bolsa, de que é um jogo. Eu discordo. A Bolsa é um lugar para comprar pedaços de empresas. Entretanto, na Bolsa há instrumentos – alguns muito arrojados – que permitem jogar e atraem muitos jogadores.

Você pode ficar na Bolsa sem jogar, sendo um investidor de longo prazo. Ou pode entrar no jogo, seja por vontade própria, seja por ganância ou nervosismo de situações extremas.

Não há problema algum em entrar no jogo, desde que você o faça por decisão própria e consciente. É um terreno para gente com mais experiência, mais tempo a dedicar e que exige mais nervos. Não aconselho entrar nesse meio, mas ele tem uma atração danada. A maioria das pessoas é atraída. Alguns vão tentar a sorte grande… estes são os candidatos a perdas grandes.

Uma das coisas que me motivou a escrever esse livro é a desmistificação da Bolsa. As pessoas que são atraídas para o jogo, depois saem frustradas,  reverberando e aumentando frases e histórias como a do aldeão e os burros. O principal objetivo deste livro é mostrar que você pode investir em empresas de capital aberto sem entrar no jogo, e deixar claro onde está a fronteira do jogo.

O jogo atrai uma boa maioria, então poderá atraí-lo também, prezado leitor. Se, ou quando, você for entrar no jogo, tenha em mente alguns conselhos básicos:

1. Não abandone a lógica de longo prazo, entre no jogo com um pequeno pedaço de seu capital. Continue a ser investidor no restante;

2. Não pense que já sabe como se comporta o mercado. Ele pode passar anos em uma tendência antes de mudar. As pessoas tendem a ir aumentando a aposta e, numa virada, podem tomar grandes e dolorosas pancadas. Entre o segundo semeste de 2002 e maio de 2008 a Bolsa subiu quase ininterruptamente. Isso atraiu muita gente e as convenceu que dominavam o jogo. Quando veio a crise, muitos desses lidaram mal com ela;

3. Não deixe que os ganhos de curto prazo afetem sua visão de longo prazo. A Bolsa não é linear, às vezes os ganhos se concentram em períodos pequenos de tempo. Quem rende um pouquinho todo o mês é a renda fixa, as ações podem caminhar aos saltos;

4. Entenda muito bem o gerenciamento de risco. Ele é mais importante que acertar ou errar;

5. Não jogue para ganhar, jogue para não perder. Você irá ganhar no momento certo. Se tiver protegido o capital, é uma questão de tempo acertar. Novamente, em outras palavras, é o gerenciamento de risco;

6. Siga alguns traders experientes. Algumas corretoras possuem alguns. Dê preferência àqueles que possuem longo histórico e que abrem as operações, anotando pontos de entrada e saída. Prefira os que falam muito de gerenciamento de risco. Evite os que prometem grandes ganhos em pouco tempo;

7. Muito, mas muito cuidado mesmo, com os fóruns da internet. Há pessoas que você não conhece que estão dando dicas de compras. Você pode estar sendo vítima de um golpe do tipo “Engenharia Social” para o mundo das ações. Quem te garante que aquele chat da internet possui de fato tanta gente? Quem te garante que não são vários perfis da mesma pessoa? Quem te garante que o “guru do canal” não possui perfis que o aclamam e o colocam naquela posição? Por que alguém daria dicas quentes a desconhecidos? Talvez para puxar uma alta e formar compradores do que ele quer vender. Melhor ficar de fora, ou muito desconfiado;

8. Não deixe de regar sua horta dos investimentos de longo prazo, colocando um pouco de dinheiro todo o mês. Ela pode parecer lenta no início… lembre-se que longo prazo é longo prazo. Sim, eu repeti o esse ítem de propósito. Tive oportunidade de conhecer grandes traders que possuem posições de longo prazo e afirmam que dessas posições sairão os maiores ganhos, no seu tempo.

4 Thoughts.

  1. Giovanni,
    Sou um iniciante na área de investimentos na Bovespa, e apesar de eu mesmo fazer as operações de investimentos(Compras e Vendas) através do Home Brooker do meu banco, suas observações sobre o Trader Maliciosos e os Fóruns na Internet me fazem procurar ainda mais o conhecimento minimo exigido sobre o assunto.

    • É importante ter claro qual chapéu você vai utilizar em um momento, e não misturar as coisas. Se começou como Trader, não vire investidor porque a operação deu errado. Sem dúvida buscar conhecimento é importante, mas isso continua sendo renda variável, sujeita a ganhos e perdas. Boa estudo e bons negócios.

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